sábado, 20 de agosto de 2016

35 | Considerações sobre os olhos dos sacanas

Eu gosto dos olhos dos sacanas, mais do que dos bons samaritanos;

conquanto possam ter a mesma cor, mostram coisas tão distintas que jamais poderiam ser considerados parecidos. 
Não trazem em si promessas vagas, futuros incertos nem tão pouco juras de amor: são só olhos, sem espelhos para a alma, sem passaportes gratuitos para o lado de dentro, sem reticências, sentidos ocultos, funções intrínsecas. 
Nada. 
São apenas olhos, com coisas típicas de olhos, como meninas-do-olho e pestanas. 
Eu não gosto de tropeçar na alma de alguém à primeira vista - as almas, como as mulheres, não se querem fáceis.  
Os homens moralmente corretos, até a cerrar os olhos contra o sol, deixam escapar os poucos segredos que guardam (sim, porque as boas pessoas não são muito dadas aos segredos). 
Já os olhos dos imbecis, esses sim têm valor: têm coisas lá dentro, como todos temos, não fossem os olhos duas pequenas janelas para o interior da nossa cabeça, mas ao contrário dos bons-da-fita cujos vidros dos olhos estão tão imaculadamente limpos que conseguimos ver os pensamentos a passear de cuecas na sua intimidade, os olhos dos sacanas são como caleidoscópios coloridos e confusos que nos dão a volta à cabeça e ao estômago. 
É, eu hei sempre de preferir os príncipes desencantados com olhos caleidoscópicamente impenetráveis. 

GRACE - line 

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